Boletim fiscal revela que aporte dos estados em investimentos públicos foi mais que o dobro da União em 2024 04/06/2025 - 15:09

Os investimentos públicos realizados pelos estados brasileiros representaram mais que o dobro do aporte feito pela União em 2024. No geral, as 27 unidades da federação investiram juntas aproximadamente R$ 86,6 bilhões no ano passado, o equivalente a 0,74% do PIB; já o governo federal desembolsou R$ 36,5 bilhões, ou 0,31% do PIB, no mesmo período.

Essas foram algumas das informações mapeadas e apresentadas, nesta terça-feira (3), durante o lançamento da 2ª edição do Boletim Fiscal dos Estados Brasileiros, uma parceria entre o Comitê Nacional dos Secretários de Fazenda dos Estados e Distrito Federal (Comsefaz) e o Centro Internacional Celso Furtado de Políticas para o Desenvolvimento (Cicef).

O estudo será disponibilizado em breve, na íntegra, nos sites do Comsefaz e do Cicef.

O vice-presidente do Comsefaz, Luís Fernando Pereira da Silva, destacou a importância dos dados para ampliar o conhecimento dos gestores e técnicos estaduais sobre a situação fiscal, tributária e econômica do país:

“O boletim é uma contribuição do Comsefaz e do CICEF para a discussão macroeconômica do país, com destaque particular para as áreas fiscal, financeira e tributária dos estados. Ele tem como finalidade última ajudar uma das razões de ser do Comsefaz, que é o aperfeiçoamento do federalismo brasileiro, fazendo com que a análise acadêmica caminhe junto da realidade do dia a dia vivenciada por cada uma das 27 fazendas estaduais. O boletim é, portanto, uma maneira de as secretarias de Fazenda, em parceria com a academia, apresentarem à sociedade brasileira as suas expertises nesses temas. Nesta segunda edição, a análise da conjuntura macroeconômica do Brasil é feita tanto a partir dos indicadores consolidados para o ano de 2024 e também de alguns dos dados já disponíveis para o início do ano de 2025. Com essas informações, o Boletim também aponta quais as principais variáveis que podem ser as determinantes do comportamento econômico para o ano corrente”, disse.

Boletim

Conduzida pelo diretor-presidente do Cicef, professor Carlos Pinkusfeld Bastos, a apresentação foi transmitida ao vivo pelo canal do Comsefaz no youtube. Segundo ele, tanto o governo federal quanto os governos estaduais ampliaram suas despesas primárias em 2024, ainda que com dinâmicas distintas, refletindo suas responsabilidades e restrições fiscais:

“A União concentrou os gastos de maior escala, especialmente em previdência e assistência social, enquanto os estados reforçaram a execução direta de serviços públicos e retomaram investimentos”, afirmou Bastos, que ainda ressaltou a relevância das despesas em investimentos realizadas pelos entes subnacionais:

“De um lado, podemos constatar que o investimento público permanece em níveis preocupantemente baixos na União, circunstância que se estabeleceu de maneira radical no período em que esteve drasticamente contido o crescimento da despesa pública e que o novo arcabouço fiscal não conseguiu reverter. Apesar de, nos últimos anos, ter sido estabelecida uma flexibilidade maior para o crescimento da despesa pública, o patamar do investimento em 2024 foi insuficiente para repor a depreciação do capital. Nesse cenário, e esta é a outra face da constatação, fica evidente a relevância dessas despesas realizadas pelos entes estaduais”, disse.

Crescimento econômico mantido

A nova edição do boletim aprofunda a análise sobre a conjuntura macroeconômica, destacando o desempenho da economia brasileira em 2024 e no início de 2025. Os dados confirmam a manutenção do crescimento econômico, impulsionado pelo consumo das famílias, mercado de trabalho e investimentos. O crescimento do PIB, de 3,4%, por exemplo, foi considerado bastante satisfatório para a média histórica brasileira:

“A primeira boa notícia foi o crescimento de 3,4% do PIB, que está acima da média tradicional, historicamente na faixa de 2,5%. Esse é o terceiro ano consecutivo que superamos a média. A segunda boa notícia é que nossa indústria cresceu também, o que reforça que o crescimento econômico puxa a indústria, ou seja, a indústria não é independente. Então o crescimento econômico tem um impacto positivo na indústria. A terceira boa notícia é que o consumo das famílias cresceu de forma vigorosa, 4,8%. E a quarta boa notícia é que o investimento público também subiu. Nenhum país consegue crescer sem investimento”, ressaltou.

Também foram abordados os efeitos da inflação e da taxa Selic sobre o crédito e a atividade econômica.

Na dimensão fiscal, o boletim examinou a evolução das finanças dos estados com base nos dados atualizados do Relatório Resumido da Execução Orçamentária (RREO) e do Relatório de Gestão Fiscal (RGF). Os resultados indicam um desempenho mais homogêneo na arrecadação do ICMS entre os estados no final de 2024, com despesas crescendo em ritmo mais moderado que em 2023, refletindo positivamente no resultado primário da maioria dos entes federativos.

De modo geral, três fatos mereceram destaque a partir dos dados coletados das finanças estaduais: tendência positiva de crescimento dos investimentos de estados, no período recente, incluindo 2024; posição relativamente segura da grande maioria das UFs quanto aos limites de gasto com pessoal, definidos pela LRF; e heterogeneidade inter-regional em relação aos gastos na sua classificação funcional – ou seja, os dispêndios em saúde, educação, segurança pública e outras funções governamentais variam de acordo com a realidade local de cada UF.

Consumo das famílias e gastos financiados por crédito são destaques

O 2º Boletim Fiscal dos Estados Brasileiros mostrou também que, entre os componentes de demanda, o resultado mais positivo foi o do consumo privado, impulsionado tanto pela elevação da propensão a consumir (3,4 p.p.), um indicador que mede a “disposição” das pessoas em gastar, quanto pelo crescimento dos gastos financiados por crédito (1,1 p.p.).

“Apesar do aumento dos alimentos no final do ano passado, a elevação da massa salarial explica o bom desempenho do consumo. Até porque os salários cresceram mais que a inflação”, disse.

O professor Carlos Pinkusfeld Bastos também chamou a atenção para a reação do investimento privado não residencial, que contribuiu positivamente para o crescimento da demanda.

“Já o investimento residencial novamente apresentou desempenho negativo no período, possivelmente influenciado por taxas médias de juros elevadas. Também esperada em um contexto de recuperação do investimento é a contribuição negativa que decorreu do forte aumento das importações e do conteúdo importado da produção (-3,0 p.p.). A construção civil não foi bem, mas o índice da formação bruta de capital fixo indica que houve investimentos em máquinas e equipamentos”, explicou.

Gasto público

O estudo destaca também que mesmo em um patamar elevado quando comparado aos anos anteriores, o gasto público federal registrou uma contribuição negativa para o crescimento do PIB (-0,3 p.p.), o que, na avaliação dos pesquisadores, pode ser explicado pelo efeito dos dispêndios com precatórios muito concentrados nos últimos dias de 2023. 

Por outro lado, quando se considera também as despesas dos governos estaduais, municipais e das empresas públicas, a contribuição da despesa pública para o crescimento da economia foi positiva (2,3 p.p).

Espaços fiscais

A diretora do Tesouro Estadual do Paraná, Carin Deda, foi convidada para comentar os principais dados apresentados nesta edição do Boletim. A economista, que também é mestre em Economia e em Gestão Urbana e faz parte do Grupo de Gestores das Finanças Estaduais (Gefin), destacou o protagonismo do investimento público dos estados.

“Houve um protagonismo do investimento público. O boletim mostrou que os entes subnacionais investiram 9% da receita corrente liquida, quase o dobro da União. E essa tendência também é observada na última década, com padrões de investimentos superiores em relação à esfera federal. Isso reforça um comportamento que só foi possível porque foram mantidos espaços fiscais para investimentos. Quando olhamos para a série histórica, vemos que houve geração de espaço fiscal entre 2020 e 2021, e entre 2021 e 2022, com aumento das receitas e redução das despesas compulsórias. A geração de espaço fiscal abriu a possibilidade para investimentos. Então é preciso reforçar esses espaços fiscais para gerar desenvolvimento nos estados e no país”, afirmou.

Assista a apresentação da 2ª edição do Boletim Fiscal dos Estados Brasileiros: